Esta narrativa tem por objetivo descrever parte do processo de reforma portuária ocorrida na segunda metade do século XIX na cidade do Rio de Janeiro ainda durante o governo monárquico.
Na segunda metade do século XIX, a região portuária do Rio de Janeiro foi um dos palcos das reformas urbanas que aconteciam na capital monárquica. Dentre os serviços que foram oferecidos na cidade naquele período temos:
No que se refere a zona portuária, o primeiro passo dado nesse sentido aconteceu através da modernização da Doca da Alfândega.
Esse processo de modernização procurou introduzir os portos brasileiros nos novos padrões internacionais de embarque, desembarque, carga, descarga e armazenamento de mercadorias.
A partir da litografia acima, podemos afirmar que, em 1861, era possível ver a região da alfândega sem grandes mudanças. Sua modernização havia começado em 1853, mas conferimos nesta imagem uma região modesta atendida pelo antigo Cais da Alfândega.
Ao aproximar a imagem anterior, pode-se realizar uma visão mais apurada desta região, perceber que ela era uma ampla área frequentada por pedestres e que possuía apenas um modesto cais de madeira. No entanto, devido a sua importância, ela foi registrada nesta litografia de Charles Ribeyrolles e numa famosa pintura de Johann Moritz Rugendas que será vista a seguir.
Na imagem anterior foi possível ver ao fundo a Igreja da Candelária e nesta figura, a partir de uma nova perspectiva, vemos, no centro da imagem, o Mosteiro de São Bento.
Os pontos destacados ao fundo, no mapa do ImagineRio, auxiliam na compreensão da perpecitva do pintor.
A beleza do colorido da arte de Rugendas aguça nossos sentidos chamando a atenção para o tráfico e para o escravagismo presentes na atividade portuária. Além disso, não nos deixar escapar a existência da Mesa de Renda de tributação do governo monárquico.
O plano de intervenção nesta região foi executado, incialmente, pelo engenheiro inglês Charles Neate. Seu objetivo era construir duas docas fechadas (Alfândega e Mercado), dois grandes armazéns, isolar a região a fim de torná-la mais segura e aparelhar o molhe com guindastes hidráulicos.
Em uma outra página do registro deixado por Borja Castro é possível identificar as estruturas presentes no projeto da Doca da Alfândega:
Armazéns, Área de Estiva, Alfândega, Docas Fechadas, Guindastes e Casa de Máquinas.
As novas estruturas podem ser percebidas ao se ampliar a imagem anterior. Gradativamente, o projeto da nova doca mudava a paisagem ao fim da Rua Direita. Se comparada a imagem de 1861, de Charles Ribeyrolles, algumas diferenças são facilmente encontradas:
A despeito de todo planejamento e do empenho do engenheiro Charles Neate, o projeto da Doca da Alfândega possuía limitações técnicas que impediam o necessário ajuste daquela região as novas demandas portuárias.
A extensão e a profundidade necessárias as dimensões das novas embarcações movidas à vapor não podiam ser atendidas.
Sendo assim, apesar da constatação de algum avanço na execução do projeto, no ano de 1863, um desabamento na catenária de sustentação do molhe da doca fechada abriu caminho para a substituição na gerência da obra.
Somado ao acidente, o longo período em que se estendia a construção também motivou a mudança na estratégia de execução.
Naquelas circunstâncias, o gerente inglês foi substituído no ano de 1866 e uma nova legislação foi produzida em 1869 a fim de retirar o financiamento das mãos do governo monárquico.
Desta forma, o engenheiro André Pinto Rebouças assumiu a gerência da obra da alfândega em 1866.
De 1866 a 1871, Rebouças corrigiu o problema na caternária de sustentação do molhe da doca fechada que havia desabado. Ele também introduziu de forma piorneira o uso do cimento Portland no Brasil e de escafandros. E enquanto dava continuidade ao gerenciamento da obra da Alfândega, executou o planejamento de uma nova doca para a cidade do Rio de Janeiro. Esse novo projeto tinha por objetivo, dentre outros, atender as dimensões e características preconizadas internacionalmente.
Contudo, em 1871, ele foi substituído na gerência da obra da alfândega por Agostinho Vitor de Borja Castro que deu sequência as obras.
O projeto foi concluído dentro de suas limitações atendendo aos objetivos para os quais tinha sido criado. Seus armazéns foram concluídos, os guindastes instalados, o acesso aos pedestres reduzidos e sua doca, embora pequena, foi fechada por meio de um molhe coberto por galpões.
Enfim, apesar de ser substituído na obra e na companhia da Doca da Alfandega, André Rebouças seguiu com seu projeto de construção de uma nova doca para a cidade do Rio de Janeiro.
Entre agosto e outubro de 1867, ele consolidou seu ideal de reforma portuária. Em seus planos, a região do Valongo, nos bairros da Saúde e da Gamboa, foi a escolhida para implementar outra doca. Este modelo tinha dimensões colossais que, enfim, poderiam atender o novo padrão internacional.
Depois de quase dois anos de planejamento, em dezembro de 1869 o projeto da Doca Dom Pedro II foi protocolado junto ao governo monárquico.
Continua...
A Modernização Portuária da Capital Monárquica: A Doca de Dom Pedro II (parte 1)